...Se por um lado é assustador, constatarmos que o grande perigo para a vida vem de nos mesmos...
PAZ
As mudanças climáticas colocam nossa espécie sob severo risco. No entanto, a maior ameaça que paira sobre a humanidade parece ser a sua dificuldade em viver de forma harmoniosa, compartilhando as riquezas do nosso planeta. Guerras de todos os tipos fazem parte de nosso cotidiano e não poupam nem países nem locais. Basta ver os cada vez mais comuns massacres em escolas e o atentado recente na Noruega.
Minha intenção está bem longe de mostrar um cenário pessimista. Ao contrário, quero abrir mais uma reflexão, entre muitas, na busca de um caminho para a Paz.
Se por um lado é assustador constatarmos que o grande perigo para a vida vem de nos mesmos, por outro lado, é animador podermos concluir que a mudança está ao nosso alcance, dependendo exclusivamente das nossas decisões sobre as questões que levam ao conflito e as desigualdades.
Nosso dia a dia é repleto de conflitos e dilemas morais: Eu quero, você não quer, eu tenho razão, você não tem, eu estou certo, você está errado. Na solução dos conflitos tentamos resolve-los com a mesma forma de pensar que os causa resultando quase sempre em pequenas guerras emocionais onde a razão provavelmente ficará com o mais forte, quem detém o poder, ou seja, através da violência.
Manda quem pode? Obedece quem tem juízo?Como coexistir de maneira sustentável?
Diversas áreas de conhecimento buscaram entender as causas do comportamento humano violento, antropólogos estudando o comportamento altamente cooperativo de certas tribos buscaram nossas “falhas” no processo de desenvolvimento social, estudiosos da mente descobriram o inconsciente e constataram como ele interfere na ação e interpretação da realidade, biólogos buscaram nos modelos da natureza os desvios do homem e filósofos e religiosos refletiram sobre o sentido e os valores envolvidos nas diversas maneiras de se estar no mundo.
Todos chegaram a um denominador comum: Um dos pontos de convergência multidisciplinar para a paz é a capacidade de cooperação, não só entre iguais, mas principalmente entre os diferentes.
Os historiadores anunciam que nos últimos dez mil anos, a humanidade está se reunindo em grupos cada vez maiores o que causa uma intensificação de conflitos, mas também propicia uma interatividade e interdependência nunca vistas...
Podemos intuir que, como muitas vezes na homeopatia, o remédio pode ser encontrado dentro do próprio veneno, a solução dos conflitos está dentro do próprio conflito. Ele não é uma ameaça em si, ele é a conseqüência natural da diversidade, portanto não precisamos evitá-lo, nem fugir dele, devemos responder ao conflito com novos paradigmas de pensamento, pois os atuais muitas vezes servem apenas para desestimular as tentativas de conciliação de divergências.
“Pela primeira vez, desde a origem da nossa espécie, a humanidade está em contato consigo mesma”, nos fala o antropólogo William Ury, “... todos, em todos os lugares, estão vulneráveis!”
Um dos grandes empecilhos para a paz é a idéia pessimista que a guerra é inevitável e que a natureza humana é direcionada para o egoísmo. Assim, a visão fatalista vai contaminando e paralisando os que em algum momento viram uma “luz no final do túnel”, mas, no enfrentamento de obstáculos maiores, acabaram por desistir...
Outro grande empecilho é a visão de que a paz, uma vez conquistada, é permanente. Cada vez que conseguimos superar os obstáculos naturais da convivência, negociando nossas diferenças, a paz evolui, mas não em uma linha reta e sempre em progressão. Naturalmente surgem momentos de crise e regressões, mas que, com o propósito consciente de cooperação, passam a serem vistos como oportunidades de mudança. As diferenças quando negociadas sabiamente e com generosidade sempre dão lugar a soluções criativas, gerando uma paz a cada dia mais firme, madura e consciente.
O otimismo foi muitas vezes relacionado com a alienação, vivi uma época (repressão militar) onde os meios intelectuais eram geralmente ambientes depressivos e a felicidade às vezes parecia algo criminosa. Compreensível, claro, mas devo ressaltar que nada mais mantenedor do status quo do que se isolar da vida social. Como o não acreditar leva geralmente a não fazer, aqueles que podem mudar o olhar de todos para novos paradigmas muitas vezes afastam-se, levados pelo pessimismo e deixando de dar sua contribuição a sociedade....
O otimismo não nos vacina contra as dificuldades e sim nos alimenta para vencê-las. Observando a natureza, percebemos que a norma da vida é a harmonização. No lugar de nos preocuparmos em acabar com as guerras, precisamos enfrentar a questão de outro ângulo, procurando maneiras de prolongar a paz. Na busca de alternativas que substituam a força e a coação, uma melhor comunicação com o outro é a melhor alternativa. Não é a toa que os pesquisadores, encontram no diálogo cooperativo a ferramenta que mais eficientemente garante a coexistência pacifica. Entre os povos mais antigos do mundo estão os bosquímanos (ou homens dos bosques) que vivem no deserto sul africano, eles garantem a paz de suas aldeias vivendo em uma sociedade igualitária e quando perguntados sobre como garantem a paz se não há chefes respondem: “- É claro que temos chefes! Na verdade, todos somos chefes. Cada um é chefe de si mesmo!”
Isso, no entanto, nada tem a ver com uma vida individualista, muito pelo contrário, quando há uma briga, todos os parentes e amigos são convidados para uma conversa coletiva e pacificadora. O problema de um é o problema de todos e a conversa pode se estender por dias, só sendo dada por encerrada quando todos estão satisfeitos.
A comunicação não violenta não acontece ao acaso, precisamos do outro para um novo olhar sobre nós mesmos, para uma reflexão sobre nossos valores e nossa ação. Precisamos entender o que motiva o outro e a nós mesmos a agir dessa ou daquela maneira e a partir daí, criar uma ponte que nos una. A Harmonia precisa de uma base para crescer e a confiança entre as pessoas pode dar esse chão, sendo construída através de atos generosos mútuos, capacidade de cooperação e muitas vezes perdão.
Agora o desafio humano e colocar de lado a arrogância. Vamos aprender a conviver dentro da humildade que abre espaço para o outro e para o novo.
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