CELEBRANDO A VIDA!
"Este é o dia que o Senhor fez; regozijemo-nos e alegremo-nos nele." (Salmos 118.24).
Segundo a narrativa da Criação - na Bíblia sagrada cristã - provem de Deus a luz que torna possível o dia, a visão, o entendimento, a clara evidência do que até então se encontrava encoberto, mergulhado sob densas sombras, guardado no inconsciente.
Naturalmente, em nível de expansão de consciência, esta Luz progressivamente aumenta sua luminosidade na medida em que os domínios da inconsciência se deixam penetrar pelos lampejos conscientes. A Luz, portanto, diz respeito ao irrompimento da razão das entranhas do reino instintivo, do trabalho de parto da natureza que, grávida da essência divina, dá à luz a consciência nos seu estágio ainda infante, mas com a inabalável vocação, rumo à plenitude.
Deus criou a Luz e a Luz abriu clareiras em meio às trevas, oportunizando o nascimento de todos os dias; e cabe a nós, individualmente, "abrir alas" para que cada dia seja um desfile de celebração. Afinal, não adianta ser dia se a bateria que segura e dita o ritmo do desfile da vida encontra-se em descompasso com a harmonia do universo. Não adianta ser dia ou viver sob o brilho dos holofotes se os pensamentos seguem mergulhados em sombras e se os sentimentos são prisioneiros da angústia.
O rei e poeta Davi sabia que, principalmente, da Luz interna depende o brilho de cada dia. Entendia que as ondas de calor, as vibrações e a luz do sol e tantas outras vibrações externas possíveis, não garantem o dia iluminado, a vida em estado de celebração. Semelhantemente, as dificuldades, as limitações, as frustrações e as perdas não podem ser responsabilizadas, sozinhas, pelo estado de tristeza e desânimo que experienciamos.
A interpretação, o juízo de valor que atribuímos, a forma como reagimos em face ao acontecimento é que, em verdade, vai resultar no estado de espírito alegre ou triste, confiante ou desanimado. Em última análise, não basta saber que Deus ordenou a existência da Luz; é imprescindível remover as sombras para que em nós a Luz brilhe.
Observando a declaração de Davi: "Este é o dia que o Senhor fez; regozijemo-nos e alegremo-nos nele", parece-me claro que ele se responsabilizava pela beleza e a abundância de cada um de seus dias.
Para celebrar a vida, Davi em primeiro lugar atribuía ao Eterno Mistério a dádiva de cada dia. Percebia que o presente era um milagre, um renascimento, uma nova era, uma grande oportunidade de recomeço que devia ser recebido com celebração. Não lhe passava despercebida a dimensão sobrenatural de cada dia, ou seja, o fato de ser uma realidade sobre a qual não possuía nenhuma ingerência. Independentemente de seus atos bons ou maus, ações ou omissões, acertos e erros, oscilações de humor, após cada noite um novo dia lhe era disponibilizado.
Em segundo lugar, sabia que o dia era um espaço aberto e disponível a infinitas possibilidades, capaz de abrigar as mais variadas criações, para ser preenchido com as potencialidades existentes em sua própria vida. Davi tinha claro em sua mente como planejava se comportar em cada dia e por isso declara; "regozijemo-nos e alegremo-nos nele". Outros certamente preferiam choramingar, entristecer, lastimar, mergulhar em autocomiseração, transferir responsabilidade, condenar ou viver a síndrome do "coitadinho de mim". Para o rei poeta, entretanto, cada dia é um espaço disponibilizado pela infinita misericórdia de Deus, que ele preferia ocupar com regozijo e celebração.
Davi tomava para si a responsabilidade e o compromisso de colorir o cotidiano, colocando em cada momento as cores que ele, como pessoa, trazia por dentro. Percebia que a felicidade pode vir de praticamente todas as fontes quando não se está imobilizado com intermináveis murmurações e insatisfações.
Em terceiro lugar, Davi não se deixava subjugar pelo monstro da mesmice. Ainda que um novo dia chegasse esvaziado de significado e carregado de rotina, para ele e para outras pessoas, o recebia como um presente único, de valor inestimável, que merecia ser desembrulhado com cuidado, gratidão, responsabilidade e com o coração em festa.
Posso imaginá-lo acordando depois de uma restauradora noite de sono, que a vida em harmonia e disciplina proporciona, e declarando "Este é o dia que o Senhor fez: alegremo-nos e regozijemo-nos nele". Davi, não obstante a árida região em que habitava e o penoso trabalho que lhe tomava o tempo, nadava em constante poesia. O deserto exterior não ameaçava o oásis de sua alma. Aquele rapaz ruivo não era simplesmente alguém que fazia poesias, mas era um poeta da vida.(*)
Oportuno lembrar que a rotina não merece ser tachada de estraga prazer, pois a falta de prazer não é culpa dela e sim da ausência de gratidão. A rotina, quando fruto de disciplina, é de inestimável valor; torna-se entediante e asfixiante quando ficamos órfãos do encantamento, quando deixamos de atentar aos detalhes, quando excluímos o mistério, quando reduzimos tudo à normalidade. A rotina torna-se desagradável quando nos faltam criatividade e encantamento. Para um apaixonado não existe rotina; rotina é para quem caminha desacompanhado de emoção. A vida é cheia de magia para quem se deixa encantar, que não é preguiçoso para pensar e nem tem medo de sentir.
Celebra e alegra-se com a vida quem não deixa apagar a chama do fascínio, quem se permite arrebatar pelo mistério das coisas simples. Quem se rebela contra todo o estado hipnótico, quem rompe com os limites da caverna, quem opta por caminhar liberto dos formatos de rebanhos massificados.
Celebra e alegra-se com a vida quem banha a alma na fonte divina, quem mergulha desnudo no Eterno Mistério, quem se deixa bronzear pelo Sol da Justiça.
Celebra e alegra-se com a vida quem se esvazia para poder acolher, opta por servir antes de desejar ser servido, quem toma nas próprias mãos as rédeas da vida.
Celebra e alegra-se com a vida quem faz do corpo um templo sagrado, quem investe na expansão da consciência, quem encontra dentro de si a divina Essência.
Celebra e alegra-se com a vida quem se limpa dos sentimentos menores, quem vive o perdão como estilo de vida, quem faz da alegria sua fonte de força.
Celebra e alegra-se com a vida quem estabelece o domicílio da mente bem distante dos preconceitos e dos julgamentos, quem se permite relaxar na rede da flexibilidade, quem se refugia no calor da gratidão, quem ama as criaturas com o incondicional amor do Criador, quem se deixa atrair pela gravidade dos céus.
"Este é o dia que o Senhor fez; regozijemo-nos e alegremo-nos nele". Celebra e alegra-se com a vida quem protege o dia de hoje das mágoas do passado bem como do medo do futuro.
Oliveira Fidelis Filho - Teólogo Espiritualista, Psicanalista Integrativo,
Administrador,Escritor e Conferencista, Compositor e Cantor.
http://www.espiritualidadeterapeutica.blogspot.com/
http://www.cassiarr.blogspot.com/ NOVA ERA DE LUZ
Comentários