Pouco ou nada mais faz lembrar a Fonte Eterna de onde jorram as divinas águas.
"Deixo-vos a Paz, a minha paz voz dou." Jesus.
Temos um antigo fascínio pela busca das origens, causas e fontes nas mais variadas áreas. Identificar a nascente de alguns dos grandes rios faz parte desta atração pelas origens que exigiu coragem, determinação, espírito de aventura e encantamento pela natureza por parte dos desbravadores que a tais projetos sentiram-se seduzidos e a eles se entregaram.Graças a eles hoje sabemos, por exemplo, que o rio Amazonas é o maior rio do mundo, quer em extensão (em 2008 herdou este título do rio Nilo) quer em volume de água. O Amazonas tem sua nascente a uma altitude de cinco mil e seiscentos metros na cordilheira de Chila, nos Andes do sul do Peru. Não obstante sua impressionante grandeza, o rio nasce esvaziado dos superlativos que lhe são atribuídos ao longo de sua épica jornada.Todo rio, grande ou pequeno, tem seu cordão umbilical ligado a uma pequena nascente. Neste aspecto faz bem quem não despreza os pequenos começos, quer para o bem quer para o mal.Dos rios é possível pescar metáforas e analogias que alimentam pensamentos e sentimentos nas mais variadas áreas do conhecimento e do comportamento humano. Há quem diga que a história dos homens é atravessada por um rio de sangue, que nossa história se confunde com a história das guerras e que fazer guerra é da necessidade humana. Entretanto, ainda que não seja algo novo e mesmo que tais acontecimentos deixem a história pontuada de eventos bestiais e sangrentos, não é nas guerras que nos sentimos abrigados, acolhidos ou em casa.Seja experienciada entre duas pessoas ou entre dois países, a guerra possui o poder de indicar onde está no nosso "tesouro", o que de fato valorizamos. É capaz de revelar o pior que há em nós, tem ainda a insanidade de poluir e até mesmo fazer secar as nascentes da paz.Vivemos em guerra, hipnotizados pelo império do Ter e nos dessedentamos na nascente pura e refrescante da paz, sob a sombra das asas do Eterno e amoroso Ser. Na busca do Ter destruímos as verdadeiras riquezas e empobrecemos; na busca do Ser expandimos nossos horizontes e nos tornamos plenos.A guerra é fruto de uma paz abortada, interrompida, cerceada do direito de viver, de se expressar; é desumanizadora e torna-nos piores que as bestas feras. Diante dos conflitos nossa humanidade perdida foge confusa, ainda que em direção às guerras já marchassem milhões de homens. Existe para satisfazer aos desígnios das sombras e do medo. Alimenta-se do orgulho, do ódio e da ganância e serve a interesses de poucos enquanto rouba os sonhos de muitos. Ainda que possa ser justificada, justifica-se em função de uma injustiça vivenciada, de uma liberdade negada, de um mal já instalado. Em face da guerra há duas alternativas: evoluir ou marchar!Em homens como Mahatma Gandhi, Martin Luther King, Nelson Mandela, entre outros, a paz teve o privilégio de ver sua pequena nascente transformar-se em caudalosos e indomáveis rios de amor, verdade, justiça, igualdade e liberdade desaguando em novas e humanizadas planícies de vivencias encharcadas de harmonia.Assim como os rios não nascem para ser contaminados e sim para possibilitar o fervilhar da vida, assim também cada ser humano é concebido, não para ser dominado pelo medo, ódio ou ganância, mas para ser um canalizador da paz, irrigando com ela a existência. É no caminho da paz que encontramos nossa harmonia, sentimento de plenitude, de humanidade, que fazemos jorrar a fonte divina que em nos habita. A paz é o nosso verdadeiro território, nossa pátria, nosso céu; é Deus em nós!
Para Jesus os pacificadores são os bem-aventurados filhos de Deus. O mestre Jesus vivenciou a Paz; nele a paz teve livre expressão. Com seus atos, palavras e valores deixou-nos aberto o caminho da Paz. Quanto ao cristianismo, é notória e repugnante a poluição que tomou conta das águas que um dia jorraram límpidas e vivificantes da Eterna Nascente. Foram poluídas pela fascinação pelo poder, com cruzadas sangrentas, com inquisições com ou sem fogueiras; guerras hipocritamente santas, destruição de culturas, discriminações e infindáveis divisões e subdivisões. Pouco ou nada mais faz lembrar a Fonte Eterna de onde jorram as divinas águas.
A nascente da paz é alimentada pela divindade que em nós habita. Mostra-se cada vez mais cristalina na medida em que os pensamentos, sentimentos e palavras são purificados pela luz Crística. O leito do rio da paz é feito de amor, seu interior é cheio de justiça e em suas margens floresce a alegria.
A Paz é a prova de que a divindade nos habita, de que tomamos posse da herança outorgada por Jesus quando disse "Deixo-vos a paz, a minha paz voz dou". A nascente de sua paz não vinha de um isolamento social, de uma reclusão religiosa, de um acampamento espiritualista. Não vinha de sua freqüência a algum lugar sagrado. Sua paz não se limitava a tempo ou espaço. Existia no coração antes mesmo de se espraiar pela consciência e na convivência.
A Paz que em Jesus brotava, jorrava cristalina e com o frescor da Graça, sem a lama das culpas, acusações e julgamentos. A paz que dele jorrava emanava do amor que o levava a apresentar-se justo diante do tribunal de sua própria consciência. O reino de Deus existia dentro dele antes de se derramar por toda a terra. Reino de uma lei só, da lei do amor que se desdobra em duas direções: para o Criador e para a criatura. Sob o domínio desta Lei que rege o universo, que sintetiza tudo que de mais sagrado existe, ele estabelecia seu caminho, sua verdade e sua vida.
Sob a Lei do Amor ele justificava seus atos, por mais contrários que fossem aos usos e costumes ou aos costumes em uso. Tal lei o fazia livre mesmo na mais cruenta prisão. Para ter paz basta uma Lei; na ausência da paz multiplicam-se as leis. Cuidemos bem da nascente da paz que em nós existe. É com as águas mansas e puras da paz que regamos e tornamos floridos e frutíferos os nossos relacionamentos.
Oliveira Fidelis Filho - psicoterapeuta, orientador espiritual e escritor.
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