Alguma dose de beleza, de delicadeza, de lirismo.
A importância do lirismo no tempo da indelicadeza
Julián Fuks
Que me perdoem os muito feios, os muito ignorantes, os muito sórdidos, mas beleza é fundamental. Já disse Vinicius de Moraes num poema equivocadíssimo, que aqui prefiro malversar: é preciso que haja qualquer coisa de flor em tudo isso, qualquer coisa de dança. É preciso fertilizar a agrura do concreto, colorir a brancura das paredes lisas, romper a imobilidade asséptica dos dias com alguma dose de beleza, de delicadeza, de lirismo.
É preciso que a vida não deixe de ser nunca, ainda que só por um instante, a eterna dançarina do efêmero.
Mantenho ao lado da minha cama uma pilha de pequenas belezas, tão banais quanto íntimas, para acessar em momentos de insensata paz, ou de sutil desespero. São livros que me habitam há um tempo incerto, transitórios e perenes, livros que têm o estranho poder de me afastar do mais contingente dos eus e assim me devolver a mim mesmo. Com eles atravesso a mim e ao mundo, atravesso a turbulência agressiva das notícias, a algazarra de tantos analistas, peritos, especialistas, todos munidos de suas razões e certezas. Com eles me abrigo na dúvida, tantas vezes saturada de lucidez.
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Julián Fuks é escritor e crítico literário.
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