A angústia que reina nos sentimentos humanos
Sobre a Fragilidade dos Laços Humanos
Zygmunt Bauman
O sociólogo polonês Zygmunt Bauman é professor emérito de sociologia da Universidade de Leeds, no Reino Unido. Bauman propõe o conceito de “modernidade líquida” para definir o presente, em vez do já batido termo “pós-modernidade”, que, segundo ele, virou mais um qualificativo ideológico.
Seus livros são povoados por idéias sobre as conexões sociais potenciais na sociedade contemporânea, nesta era comumente conhecida como pós-modernidade.
Os estudos sociológicos lhe permitem refletir sobre a angústia que reina nos sentimentos humanos, emoção despertada pela pressa de encontrar o parceiro perfeito, sempre mantido como meta ideal, nunca como realidade concreta.
Assim, os casais procuram manter relacionamentos abertos, que lhes possibilitem uma porta de saída para novos encontros.
A insatisfação está, portanto, constantemente presente na esfera da afetividade humana. As pessoas desejam interagir, buscam a vivência do afeto, mas não querem se comprometer. É o que Bauman chama de amor líquido, vivenciado em um universo marcado pelos laços fluidos, que não permanecem, não se estreitam, desobedecem à lei da gravidade, ou seja, à ausência de peso. O que provoca a famosa ‘insustentável leveza do ser’, preconizada pelo escritor tcheco Milan Kundera.
Bauman define modernidade líquida como um momento em que a sociabilidade humana experimenta uma transformação que pode ser sintetizada nos seguintes processos: a metamorfose do cidadão, sujeito de direitos, em indivíduo em busca de afirmação no espaço social; a passagem de estruturas de solidariedade coletiva para as de disputa e competição; o enfraquecimento dos sistemas de proteção estatal às intempéries da vida, gerando um permanente ambiente de incerteza; a colocação da responsabilidade por eventuais fracassos no plano individual; o fim da perspectiva do planejamento a longo prazo; e o divórcio e a iminente apartação total entre poder e política.
Bauman crê que os relacionamentos a dois não podem se desenrolar à parte da cena social, das regras do jogo estabelecidas pela sociedade global. Nada pode, segundo ele, fugir deste complexo panorama, do fenômeno conhecido como globalização.
Para o sociólogo, a fluidez dos vínculos, que marca a sociedade contemporânea, encontra-se inevitavelmente inserida nas próprias características da modernidade. É impossível fugir das consequências da globalização, com suas vertiginosas ondas de informação e de novas idéias. Tudo ocorre com intensa velocidade, o que também se reflete nas relações entre as pessoas.
Com a ideia de “liquidez”, ele tenta explicar as mudanças profundas que a civilização vem sofrendo com a globalização e o impacto da tecnologia da informação. Vivemos tempos líquidos, nada é feito para durar, tampouco sólido. Os relacionamentos escorrem das nossas mãos, por entre os dedos, feito água.
A modernidade imediata é "leve", "líquida", "fluida" e infinitamente mais dinâmica que a modernidade "sólida" que suplantou. A passagem de uma a outra acarretou profundas mudanças em todos os aspectos da vida humana.
Bauman tenta mostrar nossa dificuldade de comunicação afetiva, já que todos querem relacionar-se. Entretanto, não conseguem, seja por medo ou insegurança. As relações terminam tão rápido quanto começam, as pessoas pensam terminar com um problema cortando seus vínculos, mas o que fazem mesmo é criar problemas em cima de problemas.
É um mundo de incertezas, cada um por si. Temos relacionamentos instáveis, pois as relações humanas estão cada vez mais flexíveis.
Acostumados com o mundo virtual e com a facilidade de “desconectar-se”, as pessoas não conseguem manter um relacionamento de longo prazo. É um amor criado pela sociedade atual (modernidade líquida) para tirar-lhes a responsabilidade de relacionamentos sérios e duradouros. Pessoas estão sendo tratadas como bens de consumo, ou seja, caso haja defeito descarta-se - ou, até mesmo, troca-se por "versões mais atualizadas".
O romantismo do amor parece estar fora de moda, o amor verdadeiro foi banalizado, diminuído a vários tipos de experiências vividas pelas pessoas as quais se referem a estas utilizando a palavra amor. Noites descompromissadas de sexo são chamadas “fazer amor”.
Não existem mais responsabilidades de se amar, a palavra amor é usada mesmo quando as pessoas não sabem direito o seu real significado.
"Voluntária", esta é escolhida. Porém, e isso é importante, o objetivo da afinidade é ser como o parentesco. Entretanto, vivendo numa sociedade de total “descartabilidade”, até as afinidades estão se tornando raras.
Bauman fala também sobre o amor próprio: o filósofo afirma que as pessoas precisam sentir que são amadas, ouvidas e amparadas. Ou precisam saber que fazem falta. Segundo ele, ser digno de amor é algo que só o outro pode nos classificar.
O que fazemos é aceitar essa classificação. Mas, com tantas incertezas, relações sem forma - líquidas - nas quais o amor nos é negado, como teremos amor próprio? Os amores e as relações humanas de hoje são todos instáveis, e assim não temos certeza do que esperar. Relacionar-se é caminhar na neblina sem a certeza de nada - uma descrição poética da situação.
"Para ser feliz há dois valores essenciais que são absolutamente indispensáveis [...] um é segurança e o outro é liberdade. Você não consegue ser feliz e ter uma vida digna na ausência de um deles. Segurança sem liberdade é escravidão. Liberdade sem segurança é um completo caos. Você precisa dos dois. [...] Cada vez que você tem mais segurança, você entrega um pouco da sua liberdade. Cada vez que você tem mais liberdade, você entrega parte da segurança. Então, você ganha algo e você perde algo", afirma o filósofo.
Estamos cada vez mais aparelhados com iPhones, tablets, notebooks, etc. Tudo para disfarçar o antigo medo da solidão.
O contato via rede social tomou o lugar de boa parte das pessoas, cuja marca principal é a ausência de comprometimento.
As relações se misturam e se condensam com laços momentâneos, frágeis e volúveis. Num mundo cada vez mais dinâmico, fluído e veloz. Seja real ou virtual.
“Sem meias palavras, o capitalismo é um sistema parasitário. Como todos os parasitas, pode prosperar durante certo período, desde que encontre um organismo ainda não explorado que lhe forneça alimento. Mas não pode fazer isso sem prejudicar o hospedeiro, destruindo assim, cedo ou tarde, as condições de sua prosperidade ou mesmo de sua sobrevivência”. Zygmunt Bauman
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Considerado um dos pensadores mais eminentes do declínio da civilização e publicou quatro dezenas de livros que viraram best-sellers. Seus livros venderam mais de 200 mil cópias.. Entre eles, os principais são Amor Líquido, Globalização: As Conseqüências Humanas e Vidas Desperdiçadas.
BAUMAN, Zygmunt – Amor Líquido: Sobre A Fragilidade Dos Laços Humanos
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