Uma parte de nós que é comum a todas as coisas
Todos somos capazes de compreender o mundo em nós, de
interpretar a vida pelos nossos olhos num esforço que dê
sentido a esse ato de existir. Embora o conhecimento possa
ser transmitido( propagado pela palavra escrita de um livro,
pela palavra falada de um mestre) a sabedoria, essa, é grande
demais para comportar tais limitações. Não a podemos pedir
emprestada e muito menos aprendê-la em escolas; ela é, e sempre
será, o resultado da compreensão que fizermos do mundo e da
vivência interna dessa realidade de Fogo que somos nós, em
essência.
...
É por tudo isto que vos digo que amar os outros não é procurar
recompensas e virtudes, não é subir ao palanque à espera de
aplausos, mas humildemente colocarmo-nos num mesmo patamar e
de uma forma discreta partilhar com todos a alegria de quem soube
reconhecer no rosto de cada homem o olhar de um irmão.
Um olhar que não tem nome, que não tem cor, que não tem credo
nem nacionalidade. Um olhar que é cristalino sem os contornos de
um rosto de máscaras; puro na profundidade de um gesto que nos
acolhe, que nos conforta. No olhar de cada ser poderemos encontrar
a nossa identidade; observar o reflexo da nossa imagem que nos fala
de dentro desse mesmo olhar, revelando-nos que lá bem fundo
também estamos nós.
Quando compreendermos isso, todas as máscaras cairão, todas as
diferenças se esbaterão; credos e nacionalidades tornar-se-ão
pequenos e insignificantes, já que em cada homem saberemos
reconhecer uma parte de nós que é comum a todas as coisas. E só
então poderemos sentir essa linguagem universal que é o Amor.
Uma linguagem que não tem donos nem patronos, que não tem
línguas nem dialetos, que não está subordinada a desejos ou
paixões, que não se impõe a ninguém, despertando apenas na
interioridade de cada um. É a linguagem que harmoniza todo o
universo; a expressão máxima da vontade de Deus que nos inspira
cada momento, cada reflexão, cada intuição feita sabedoria. É a
ternura de um sorriso, a alegria de um gesto, a sonoridade límpida de
um sussurro silencioso, mas tão expressivo quanto o maior dos gritos.
Compreender essa linguagem... é aceitar o todo
na universalidade de cada parte, e cada parte na unidade de uma só
consciência.
...
E só então estaremos prontos para compreender o significado do
verdadeiro amor. Um amor que não é patrimonio de uns quantos,
mas de todos os homens que procurem em si a compreensão de tal
gesto. Que o vejamos como o resultado do respirar de Deus; o
oxigenio inalado pelos Seus pulmões que depois de transportado
pelo sangue chegará a cada célula, alimentando-a. Se ignorarmos
esse alimento universal, ficaremos incapazes de cumprir as funções
que nos estão destinadas dentro desse corpo Cósmico.
Alimento, esse, que se recebe sem a necessidade de cupões, de
inscrições, sem esperar que alguém nos diga que já podemos ter a
nossa parte. Compreender esse amor, é abrir a nossa consciência
para o mundo e para os outros, é aceitar cada pessoa como uma
parte de nós na partilha de um espaço que nos tem por irmãos. E
isso é algo que está ao alcance de todos
...
Que não nos cristalizemos em dogmas que tantas vezes invalidam
um esforço bem intencionado. Não é suficiente saber cada palavra de
uma escritura sagrada, mas interpretá-las na compreensão de um
gesto que faça dessas palavras terreno fértil para um despertar que
nos permita compreender os verdadeiros propósitos de Deus. Dizer
que se ama porque está escrito num qualquer livro, porque tal mestre
assim o disse, de nada serve. Temos que transformar essa palavra
num sentimento que nos permita expressar esse mesmo amor.
Repetir rituais, dizer de memória as palavras de homens sábios, e
depois não praticar essas mesmas palavras nos gestos, nas atitudes,
na postura sincera e humilde diante dos homens, é ignorar os
verdadeiros propósitos que estão por detrás dos ensinamentos que
nos foram deixados.
E que não façamos do conhecimento um fim a alcançar, mas sim um
meio para alcançar a sabedoria que nos permita olhar para além dos
conceitos, das verdades instituídas, das frases que se repetem até à
exaustão sem a devida compreensão daquilo que cada uma delas
transporta por detrás dos seus adornos. Apenas esse entendimento
nos poderá ajudar a construir as bases de uma existência que seja
coerente com os princípios que dizemos seguir, mas cujo verdadeiro
significado tantas vezes ignoramos.
Do livro: Reflexoes Espirituais para uma Nova Terra - Pedro Elias
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